sábado, 29 de outubro de 2011

ANTÓNIO BARAHONA, por David Teles Pereira

Habituámo-nos a ver a intemporalidade à distância de uns quantos séculos. As palavras de Tucídides, que nos falavam de “uma obra que não foi concebid[a] para ganhar prémios ao ser ouvid[a] de momento, mas como um legado para sempre”, são interpretadas como se realmente tivesse que passar um “para sempre” pelas obras para estas serem dignas da tão honrosa memória.
António Barahona é um poeta intemporal, porque esta palavra deve necessariamente ter o sentido que Tucídides lhe deu, mas deve também ter outro sentido, o da comunicação vibrante entre o antigo e o novo, entre o consagrado e a promessa. Neste sentido, este “poeta limpo, obstinado” que mede “linha a linha o universo que o seu gesto d’escrita construiu”, ocupa um lugar na poesia portuguesa que até agora esteve sempre vago.
António Barahona é um dos poetas do Café Gelo, “um café à beira do abismo: conversas incendiadas, sismo a sismo, no desabar da época”, é amigo de Cesariny e de António José Forte, este último um poeta “com a morte perto e grande coração”, é o homem que ama “a mesquita grande de Lisboa, as suas colunas de luz pétrea e a cúpula com os noventa e nove nomes de Deus”. Mas é também o velho principiante cuja “aprendizagem, como poeta, foi lenta e dolorosa”, é o “bruxuleante jovem, muito velho”, é o poeta que, da sua idade, é capaz de nos surpreender com versos de uma paixão a ferver de juventude: “Contigo nos meus braços sou capaz de atravessar paredes, tornar-me invisível, fazer milagres”.
É raro, muito raro mesmo, um poeta com o percurso de António Barahona fazer aquilo que ele fez em “O Som do Sôpro” ou em “Raspar o fundo da gaveta e enfunar uma gávea”. Entre outras coisas, há um desejo que atravessa estes dois livros, o desejo da comunicação com os poetas mais novos e com a sua poesia, na qual o António se coloca tanto na posição de mestre como na de aprendiz. Tão raro é que tão poucos o têm notado, provavelmente vítimas do hábito de vermos os poetas consagrados mais preocupados em ultimar os detalhes da posição de estátua que querem ocupar para a posteridade, do que em estreitar um abraço aos outros. E, como num abraço, António deu e recebeu.
Julgo ser esta a posição que ocupo aqui hoje, não a de editor do António Barahona num dos melhores conjuntos que já tive o prazer de publicar com o Diogo na Criatura, não a de crítico que, por vezes, tem escrito sobre poesia, mas a de jovem leitor e poeta que encarecidamente agradece a António Barahona o este não ter estado à distância a que todos os outros, ainda que legitimamente, nos têm votado. Assim, com este poeta aprendemos algumas essencialidades sobre a poesia: “Não ter pressa, excepto quando se trata de encontros com Deus.”; “O homem antes de falar cantou sílabas reveladas sem semântica e só depois falou”; “Dizem que poeta não é uma profissão, mas eu digo que poeta é, sim, a profissão maior, repleta d’amor que não se esfuma”.
Mas, no meio de tudo isto, o que acaba por ser surpreendente, principalmente para os mais novos, é que o António é, como bem referiu o Manuel de Freitas, um dos grandes novíssimos da nossa poesia. A sua escrita é, com o seu acordo ortográfico próprio e perfeitamente fixado, um esforço de movimento, de eco, tanto no sentido sonoro como no sentido ideal desta palarva, e, também, de aprendizagem que “obriga”, como o poeta nos diz, “à constante reescrita do poema”. É na “Grande-Guerra-Santa da prosódia”, a expressão é do autor e não minha, que se constrói a matéria do poema e para tal, primeiro que tudo, “pesam-se os tons das sílabas”. A lição é simples, ter esta humildade já não o é tanto e, muito menos, é conseguir fazê-lo.
Por isso, tenho que aproveitar esta oportunidade para dizer o mesmo que Yarir disse no seu poema de homenagem a Al Farazdaq: o António Barahona, enquanto poeta, não descansou enquanto não deixou para traz de si, em toda a fera, o golpe de um trovão.

No EXPRESSO, 29 de Outubro de 2011:

terça-feira, 25 de outubro de 2011

E, mais tarde, no mesmo dia:


2º Encontro:
António Barahona

Moderador: Golgona Anghel

Mesa:
David Teles Pereira
Gil de Carvalho
Luís Gomes
Manuel de Freitas

28 de Outubro

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Edifício ID, r/c
18h-20h

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Um depoimento: GOLPE D'ASA

A Golpe d’asa estará no começo do mês que vem, Novembro, à disposição de quem a quiser receber. Uma das questões colocadas por António Guerreiro no primeiro encontro destas Poéticas Contemporâneas respeitava à razão de se fazer mais uma revista de poesia quando existe um número significativo delas. Uma questão provocatória, claro, talvez para testar os meus nervos, emissária de uma revista que nem sequer podia ser comprovada nem, algo importante, confrontada. Presumo que, à minha semelhança, também António Guerreiro achará que em termos de publicação de poesia nada será em demasia, apenas é em demasia o que é mau e, aí, nem de poesia poderá ser chamada. É qualquer coisa de gato em vez de lebre, de maruca em vez de pescada, mas que não enganará o palato dos leitores experimentados, dos que conhecem os prazeres do deleite e rejeitam as torturas do embuste.
Em jeito de síntese, tentei expressar em que medida é que a revista poderá constituir uma novidade e em que aspectos se aproxima de outras. Em suma e por objectivos axiais, pretende recuperar alguns poetas do passado recente que tenham, no nosso entender e contando sobretudo com a nossa sensibilidade à aragem do tempo, caído em esquecimento ou que para lá caminhem; por outro lado, está atenta à escrita dos novos autores. Sei que existem revistas que desempenham este papel de divulgadoras e, até mesmo, de catapultadoras de autores completamente inéditos. Sendo Portugal um país relativamente pequeno e sendo ainda mais pequeno o acaso de nascer uma poeta ou um poeta, não nos poderemos dar ao luxo de cairmos no ridículo de pretendermos que tenham ocorrido cópulas providenciais. Bastar-nos-á, como disse, publicar novos poemas de autores que vão sendo conhecidos, vão sendo lidos. Se o acaso nos conceder encontrar um novo nome que mereça a nossa atenção, então estaremos a cumprir o papel que tradicionalmente é atribuído às revistas.     
O que me parece de maior novidade, e sem me querer alongar muito, é a geminação de textos críticos aos novos ou éditos poemas, arriscando, não raras vezes, primeiras leituras sobre a escrita de autores que ainda não têm lastro crítico ou que, no caso dos éditos, saíram do foco, estão a sufocar nos fundos de catálogos, nas catacumbas das bibliotecas ou, ainda mais revoltante, nas casas dos poetas que ainda estão vivos mas que a voracidade deste mundo editorial julga ter conseguido passar atestados de óbito. Para além disto, terá um caderno central por número, dedicado à razão de novo/provecto autor, alternadamente, entre outras coisas que poderão a seu tempo ler.
A questão da necessidade de haver mais intervenção crítica foi pertinentemente colocada e discutida em conjunto com o auditório. Longe de nós considerarmo-nos arautos dessa necessidade, mas tentaremos contribuir na medida das nossas possibilidades. É uma questão que pessoalmente me diz muito. Contra mim mesma falo, que durante anos fui uma leitora politicamente passiva – este advérbio corresponde ao meu entender de intervir activamente na coisa pública. Os leitores demitem-se, salvo raras excepções. E eu tenho-me cruzado, felizmente, com óptimos leitores de poesia que me têm proporcionado momentos de conversa estimulantes, encantadores, instigantes. A poesia deveria ter dois momentos de leitura: a íntima e a pública, para que ela cumpra o seu objectivo de ir mudando o mundo de forma mais consciente e a luta não se faça só pelo necessário naufrágio mas também pelo sufrágio, pelo direito à palavra de leitor, pela debate de ideias, de sentimentos, de gostos. Talvez encontre aqui a resposta à pergunta inicial: porque razão? Por isto só, por se abrir mais um café, entre outros que já existem, onde possamos votar o nosso tempo, publicamente, à poesia.

Ana Salomé

Um depoimento: AGIO

A Agio é uma revista anual dirigida por Sara M. Felício e Paulo Tavares. O primeiro número – e único, até ao momento – data de Fevereiro de 2011. Enquanto projecto editorial, a Agio surge como natural prolongamento da Artefacto, editora que está essencialmente voltada para a publicação de novos autores. Ambas surgem com a constatação de que, apesar das maiores facilidades de publicação que os autores podem encontrar actualmente (seja pelo print-on-demand/edições de autor, ou por editoras que se aproveitam dessa vontade de publicar com um horizonte de expectativa fundamentalmente centrado na vertente financeira), havia ainda, no nosso entender, algo a fazer em termos de edição de textos que tinham alguma dificuldade em encontrar o seu espaço público em forma impressa.
O título da revista partiu de uma leitura de A comunidade que vem, de Giorgio Agamben. Neste livro, Agamben reflecte sobre o “à-vontade” ou “acolhimento” para que a palavra remete em italiano e, indo às suas raízes etimológicas, agrega-lhe uma ideia de espaço adjacente onde cada um se pode mover livremente. Este lugar adjacente é igualmente o espaço do porvir. Poderemos desenvolver ainda um pouco mais o conceito e dizer que «agio» é o lugar reservado a todas as formas de arte. São estas ideias de acolhimento, de porvir, de criação livre de constrangimentos que nos interessaram e nos levaram a escolher esta palavra/título como traço definidor da revista. Sendo essencialmente uma publicação de textos literários (onde cabem também o ensaio e a entrevista), há uma inerente tentativa de comunicar com outras literaturas e com as outras artes – característica, no fundo, comum a várias revistas contemporâneas.
Se é verdade que durante grande parte do século XX as revistas literárias se constituíram como laboratórios para grupos mais ou menos coesos de escritores/poetas, movimentos, vanguardas, etc., o final do século XX e o princípio do século XXI vieram a revelar uma maior dispersão e dissolução daquilo que poderemos designar como veiculação de ideais estéticos comuns. Neste sentido, poder sinalizar a diversidade e a abrangência actuais num ideário de comunidade – que, inevitavelmente, surge a partir do seu fracasso –, colocando várias abordagens, perspectivas e sensibilidades em contacto, talvez seja o que, de alguma forma, poderá distinguir a Agio, sendo também o que a torna mais vulnerável a eventuais críticas. É um risco, no entanto, que nos parece fundamental correr. Sendo ainda um projecto embrionário, é possível que, num futuro próximo, a Agio se possa ainda vir a metamorfosear.


No PÚBLICO, 12 de Outubro de 2011


As artes sempre foram, são e serão minoritárias




António Pinto Ribeiro
in Ípsilon

As organizações culturais comprazem-se noticiando a quebra de recordes do número de espectadores de exposição para exposição, de temporada para temporada. Uma falácia que alimenta o populismo e a demagogia sobre as artes e os artistas, fazendo equivaler a recepção de uma obra ao consumo de um qualquer produto de supermercado

Há uns anos muita da crítica na imprensa decidiu incluir nos seus textos uma valoração em estrelas, bolinhas, ou mesmo números, que encima a respectiva crítica. Mais recentemente, e no que diz respeito a críticas a obras de artes performativas, a esta valoração é acrescentada a menção: sala quase vazia, meia sala ou sala cheia, tentando com isto, e ainda antes da opinião do crítico, sumariar a qualidade, a pertinência e o valor artístico da obra em causa. Tais práticas correntes contribuem para fomentar a relação perversa entre juízo do crítico e a suposta pertinência da obra, que passa a ser dada pela classificação e pelo número arbitrário de espectadores que a ela assistiu, número que por sua vez permite todo o tipo de especulações sobre uma suposta auto-sustentabilidade financeira da referida obra. Claro que isto começou a acontecer porque a crítica, enquanto instituição, tinha já perdido o seu poder, e o facto de haver uma classificação que, embora pudesse variar entre os críticos, se supunha basear-se em critérios comuns fundamentava uma prática corporativa, assim recuperando algum poder na definição do estatuto de arte para as obras classificadas. Mas tal iniciativa, desprovida de qualquer justificação estética ou de juízo crítico, foi de imediato adoptada por várias organizações culturais que, face a um concerto, a uma exposição ou no relatório anual de actividades, elegem como primeiro factor de avaliação da sua actividade artística o número de espectadores que tiveram ou, mais ainda, se comprazem noticiando a quebra de recordes de ano para ano, de exposição para exposição, de temporada para temporada, do número de espectadores, indicados sem qualquer referência contextual ou o mínimo de sofisticação intelectual. Estamos nestes casos no domínio exclusivo do consumo, que, de uma forma muito primária, faz equivaler a recepção de uma obra à compra de um qualquer produto de supermercado. Sabemos quanto Guy Debord, Jean Baudrillard, Pierre Bourdieu, John Frow e muitos outros analisaram com particular perícia a transformação da obra de arte na sociedade contemporânea em mera mercadoria dentro de um sistema de valores que é, no circuito de produção e distribuição, completamente arbitrário. É isto que faz com que uma obra de arte possa valer x ou y, do mesmo modo que um gestor tanto pode ganhar mil como milhões, sem que tal tenha qualquer correspondência com o valor de uso, a quantidade de energia produzida ou os níveis de necessidade de sustentação do autor ou gestor. Que sejam interlocutores dos mecanismos de criação e de difusão das artes a sustentar a valoração do que vêem e apresentam prioritariamente na dimensão do consumo diz bem de como o sistema das artes perverteu a relação privada da obra com o seu receptor e com o seu autor, gerando um conjunto de falácias que alimentam o populismo e a demagogia sobre as artes e os artistas.

A classificação em estrelas (e não é por acaso que são estrelas, com tudo o que remete para a dimensão glamorosa do espectáculo, ainda que se possa tratar de literatura e até de poesia) ou números (como se tratasse de uma classificação de examinador), na sua pretensa objectividade e sumarização, não diz das condições físicas de recepção da obra, do humor do crítico, do contexto de produção e de difusão da mesma. E sobretudo não diz de algo que é absolutamente subjacente e determina a recepção e a valoração da mesma: o dinheiro, os afectos, o encantamento, o gosto, a teoria privada do crítico sobre arte, a sua agenda particular, os seus fetiches artísticos. Donde se prova que as estrelas e outras valorações quantitativas são um absurdo nefasto que nenhum motivo, como a falta de tempo do leitor ou o excesso de oferta, justifica. Por sua vez, a alusão quantitativa aos públicos de uma obra pouco ou nada diz quer sobre a obra em causa, quer sobre os próprios públicos, e é dos aspectos mais perniciosos e que maior manipulação permitem aos políticos e aos mecenas populistas.

São muitos os exemplos de obras que foram feitas para os públicos que "haveriam de vir": "Os Lusíadas", a obra de Beckett, a "Recherche" de Proust, que na época não tiveram público e não necessariamente por maldade deste mas porque a recepção de uma obra exige um tempo adequado à mesma e a actualidade não é sinónimo de contemporaneidade. A opacidade intrínseca de uma obra nunca é popular, no sentido de geralmente acessível. São aliás estas duas as razões fundamentais por que uma obra de arte foi, é e será sempre minoritária, sendo que esta dimensão minoritária não é quantificável, ou seja, a medida não passa pelo número de ouvintes ou receptores presentes. Uma obra feita para um único espectador tem a sala cheia se houver um espectador - e há vários exemplos recentes -, bem como uma sala de 1.500 lugares cheia pode querer dizer que fica aquém da expectativa de angariação de público que poderia ser do dobro ou do triplo.

Quer isso dizer que todas as obras que num determinado momento se tornaram populares são más? Não necessariamente, mas quer dizer que de um modo ou de outro houve algum grau de recepção da obra - dos muitos níveis que há nela - que a tornou popular para além daquilo que são os mecanismos de promoção da obra, aspecto fulcral desde a alfabetização geral, o estímulo ao consumo, a associação do consumo de arte a um status, a dimensão decorativa da produção artística, a confusão entre ecletismo e ausência de gosto e a dimensão do reconhecimento, estímulo maior da presença de um público ou de leitores. Tanto mais um produto é publicitado ou está presente nas prateleiras de um supermercado à altura dos olhos, tanto maiores são as possibilidades da sua aquisição, ao contrário de objectos ou obras desconhecidas ou não publicitadas. O que significa dizer que uma exposição teve 5.000 espectadores na sua inauguração? Nada em relação à pertinência artística da obra. Muito em relação à dimensão tribal do lugar, do evento, do DJ desse dia, do marketing utilizado, para o qual foram precisos recursos financeiros. A obra não existe fora da sua recepção e há obras que, pela sua fragilidade física, semântica ou plástica, são à partida minoritárias, esperam pouco público, particularmente um público que quer conhecer, e não apenas reconhecer, o público para quem há uns anos havia uma estação da rádio que tinha o slogan exacto - "para uma imensa minoria". O canal acabou e um enorme vazio ocupou o seu lugar e a imensa minoria passou a inexistir.

A minoria presente face à recepção de uma obra não decorre da incapacidade técnica ou artística dos seus autores. É aliás muito mais comum encontrar esta falta de qualidade em espectáculos de grandes audiências. Que qualidade técnica ou que recepção artística se podem ter numa ópera ou num concerto de estádio para milhares de pessoas em que a obra é mediada por ecrãs e todo o som sujeito a uma intervenção determinante do técnico de som?

É imperativo afirmar que todo o autor, artista, director de museu, de galeria, editor deseja ter públicos, leitores, espectadores, encher as salas, porque muito triste é uma sala vazia, uma exposição sem público, os livros atirados para o depósito. E se são gestores públicos e conscientes (e porque não o hão-de ser?) têm consciência de que estão a gerir dinheiros públicos; contudo, não a qualquer preço e, sobretudo, não entendendo que a receita de bilheteira seja o atestado da qualidade da obra, até porque as receitas são outro aspecto de complexa análise e que está enredado em dogmas: o estado da economia familiar reflecte-se na aquisição do bilhete, a distância é um factor de aquisição, o custo por espectador é de muitas formas variado.

De facto, seria desejável que, no actual sistema de produção, a aquisição contribuísse para pagar o custo de obra, que o número de compradores aumentasse de tal forma que se aproximasse dos custos reais, porque de algum modo autonomizava ainda mais a produção. Aqui estamos no domínio da sociologia da arte e sabemos como as artes são historicamente minoritárias e que mesmo em países de grande escala não pagam os custos: algum entretenimento sim, mas mesmo esse é geralmente pago pelos recursos financeiros cativados pelos mecanismos publicitários mais massificadores. Não há pois qualquer argumento que possa atribuir uma relação directa entre públicos e bilheteira, entre bilheteira e qualidade da obra, entre quantidade de público e pertinência da obra. O discurso político que assim o afirma fá-lo por motivos populistas a que geralmente se acrescenta um enorme desconhecimento sobre os mecanismos de produção artística, a formação dos públicos e mesmo a própria história das artes. E ainda, porque todas as avaliações decorrem de um grau de irracionalidade, são geralmente discursos ressentidos na exacta expressão de Max Scheler: porque é que uma minoria entende uma obra que eu não entendo e ainda por cima pode ter prazer com ela? Disto eu me ressinto, diz o discurso do ressentido.

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

Um depoimento:

INSCRIPTIO

As revistas literárias são o berço da nação poética.


 
Depoimento de Ricardo Álvaro sobre o 1º Encontro de Poéticas Contemporâneas dedicado às Revistas literárias do século XXI.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Um depoimento: PIOLHO

Piolho, revista de poesia:

«PIOLHO é uma revista de poesia
Uma sebenta que circula de mão em mão
Nesse charco que é o POEMA
COM NOVE BURACOS
QUE SANGRAM escárnio e maldizer
Nesta época em que os poetas
Se crepusculizam»

A Piolho é uma revista editada pelas Edições Mortas e a Black Sun Editora.
A. Dasilva O. teve a ideia. Nasceu numa conversa à mesa do café Piolho num final de tarde de Março 2010. Falido, vê-se obrigado a parar a actividade irregular da Edições Mortas, mas não convencido regressa ao passado como editor de revistas.
O seu primeiro número (Maio de 2010) foi de fabrico caseiro, honrando as publicações a setencil que no tempo da ditadura (anos cinquenta, sessenta) circulavam clandestinamente nos cafés; assim como os fanzines dos anos oitenta.
Acaba de sair o sexto número.
Tem tido uma regularidade bimensal.
Paginação fixa: 48 páginas.
Cada número abre e fecha com duas ilustrações, desenhos, fotos...
Tem uma secção fixa: Traídos para português, dedicada à tradução de um autor.
O critério é o de tentar em cada número publicar poesia.
Lutar contra o estado poético com um lirismo litigioso e denunciador da inscrição violência.
O silêncio como desobediência poética.
Tem números temáticos: o número 4 - heteronímia.
A sua tiragem tem sido de 300 exempalres.
A sua distribuição é não comercial. Venda à mão, na internet e nalgumas livrarias de Braga, Porto e Lisboa.



quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Um depoimento: TELHADOS DE VIDRO

      A Telhados de Vidro surgiu em Novembro de 2003, graças ao esforço conjunto de Inês Dias, Manuel de Freitas e Olímpio Ferreira. Foi o Olímpio, há que dizê-lo, quem deu rosto e personalidade gráfica a esta revista. E é por respeito ao seu trabalho – e in memoriam – que temos mantido as sóbrias mas eficazes (e belas) opções gráficas que o Olímpio connosco partilhou.
      O primeiro capista foi, obviamente, o Luis Manuel Gaspar – amigo desde a primeira hora e responsável, também, pelo logotipo da Averno (um dedo que aponta um caminho, mesmo que isso doa, um dedo ferido mas que insiste em escrever – interpretem-no como quiserem). A ideia inicial, à qual temos sido fiéis, é escolher um artista diferente para a capa de cada número – com a explícita condição de que a imagem escolhida nunca tenha sido anteriormente impressa em livro.
      A Telhados de Vidro, desde o primeiro número, escolhe previamente os colaboradores. Trata-se, muito simplesmente, de uma questão de gosto (o da direcção, claro) e de uma recusa em convidar autores que não respeitemos quer enquanto artistas, quer enquanto pessoas. Não existe, portanto, nem uma poética minimamente comum nem a veleidade de constituir qualquer programa, movimento ou tendência. Existirá, isso sim, uma ética semelhante: os autores até aqui incluídos na revista têm uma clara aversão ao espectáculo cultural, à pornografia mediática, às ânsias festivaleiras. Com registos e idades muito diversas, os autores que foram comparecendo na Telhados de Vidro são a prova evidente de que esta não é, ao contrário do que um cretino escreveu, «o órgão teórico oficial do grupo dito dos “poetas sem qualidades”». Ainda que à revelia da direcção – que não vai em grupos, e teorias, então, só se estiverem muito bem sentadas -, duvidosamente Hölderlin, Marcial, Rui Nunes, Louise Glück, Herberto Helder, Ana Teresa Pereira, António Barahona ou Rosa Maria Martelo se reveriam nesse rótulo grosseiro. Até porque, sublinhe-se, a Telhados de Vidro não é uma revista de poesia; é uma revista, apenas, com espaço para a prosa, a tradução, o ensaio, a recensão.
      Interessa-nos, acima de tudo, uma certa liberdade (já que a «liberdade livre» é, para nós, demasiado utópica). E, por isso mesmo, não temos periodicidade obrigatória, nem qualquer apoio financeiro exterior. É ainda em nome dessa precária mas possível liberdade que não fazemos números temáticos. Cada autor por nós convidado pode escrever sobre o que bem lhe apetecer, e da forma que lhe parecer melhor. Cumpre-nos, depois, fazer a revisão, a edição, a distribuição. E colocar a revista onde a sabemos desejada – e apenas aí, pois já tivemos calotes e imposturas mais do que suficientes.
      O número 1 da Telhados de Vidro tinha 96 páginas; o mais recente tem 184 páginas. Não crescemos, nestes oito anos, em ambição ou visibilidade. Cresceram, tão-só, alguns afectos – que conduziram a outros afectos e modos de escrita. Foi (está a ser) um fenómeno natural, de afinidades que se vão estabelecendo. O facto de esta ser uma revista de amigos – que jantam ou sofrem juntos, que se preocupam uns com os outros, que se admiram reciprocamente – é algo que não nos incomoda nada. Já temos, lá fora, inimigos que cheguem.



domingo, 2 de outubro de 2011

No EXPRESSO, 1 de Outubro de 2011:


1º Encontro:
Revistas literárias do século XXI

Moderador: António Guerreiro

Com a participação de:
Ana Salomé (GOLPE D’ASA)
Fernando Guerreiro (PIOLHO)
Gastão Cruz (RELÂMPAGO)
Luís Henriques (JORNAL DA OFICINA DO CEGO)
Manuel de Freitas (TELHADOS DE VIDRO)
Mariana Pinto dos Santos (INTERVALO)
Paulo Tavares (AGIO)
Tatiana Faia (ÍTACA)

30 de Setembro

Faculdade de Ciências Sociais e Humanas
Edifício ID, r/c
18h-20h