quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Um depoimento: AGIO

A Agio é uma revista anual dirigida por Sara M. Felício e Paulo Tavares. O primeiro número – e único, até ao momento – data de Fevereiro de 2011. Enquanto projecto editorial, a Agio surge como natural prolongamento da Artefacto, editora que está essencialmente voltada para a publicação de novos autores. Ambas surgem com a constatação de que, apesar das maiores facilidades de publicação que os autores podem encontrar actualmente (seja pelo print-on-demand/edições de autor, ou por editoras que se aproveitam dessa vontade de publicar com um horizonte de expectativa fundamentalmente centrado na vertente financeira), havia ainda, no nosso entender, algo a fazer em termos de edição de textos que tinham alguma dificuldade em encontrar o seu espaço público em forma impressa.
O título da revista partiu de uma leitura de A comunidade que vem, de Giorgio Agamben. Neste livro, Agamben reflecte sobre o “à-vontade” ou “acolhimento” para que a palavra remete em italiano e, indo às suas raízes etimológicas, agrega-lhe uma ideia de espaço adjacente onde cada um se pode mover livremente. Este lugar adjacente é igualmente o espaço do porvir. Poderemos desenvolver ainda um pouco mais o conceito e dizer que «agio» é o lugar reservado a todas as formas de arte. São estas ideias de acolhimento, de porvir, de criação livre de constrangimentos que nos interessaram e nos levaram a escolher esta palavra/título como traço definidor da revista. Sendo essencialmente uma publicação de textos literários (onde cabem também o ensaio e a entrevista), há uma inerente tentativa de comunicar com outras literaturas e com as outras artes – característica, no fundo, comum a várias revistas contemporâneas.
Se é verdade que durante grande parte do século XX as revistas literárias se constituíram como laboratórios para grupos mais ou menos coesos de escritores/poetas, movimentos, vanguardas, etc., o final do século XX e o princípio do século XXI vieram a revelar uma maior dispersão e dissolução daquilo que poderemos designar como veiculação de ideais estéticos comuns. Neste sentido, poder sinalizar a diversidade e a abrangência actuais num ideário de comunidade – que, inevitavelmente, surge a partir do seu fracasso –, colocando várias abordagens, perspectivas e sensibilidades em contacto, talvez seja o que, de alguma forma, poderá distinguir a Agio, sendo também o que a torna mais vulnerável a eventuais críticas. É um risco, no entanto, que nos parece fundamental correr. Sendo ainda um projecto embrionário, é possível que, num futuro próximo, a Agio se possa ainda vir a metamorfosear.


Sem comentários: